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quarta-feira, 3 de outubro de 2007

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Arquivo Histórico do Itamaraty - Brasília/Rio de Janeiro
Banco Safra - Projeto Cultural

Bibliografia

Frei Jaboatão - Crônica Vol I e II
Famílias Baianas - Bulção Sobrinho
Relação Panegyrica das Honras Fúnebres - João Borges de Barros
Catálogo Barbosa Machado - 2273 Calmon, Francisco, 1703- pag. 197
Revistas do Instituto Genealógico da Bahia - Dantas Júnior

Bandeirantes e Sertanistas Baianos - Francisco Borges de Barros
Prosadores e Poetas na Bahia - Dr. Cláudio Veiga
Os Tumulos - Domingos Borges de Barros
Festas e utopias no Brasil Colonial - Mary Del Priore
Enciclopédia dos Municípios Brasileiros - Jurandyr Pires Ferreira
Pedro II e o século XIX - Lídia Besouchet
As Barbas do Imperador - Lilia Moritz Schwarcz
Patriarcado e Religião as Enclausuradas Clarissas do Convento do Desterro da Bahia 1677/1890 - Anna Amélia Vieira Nascimento
Salões e Damas do segundo Reinado - Wanderley Pinho
D. Pedro II e a Condessa de Barral - Raimundo Magalhães Jr.
Abrindo um Cofre - Alcindo Sodré
Cartas a Suas Majestades 1859 - 1890 - Ministério da Justiça Arquivo Nacional

segunda-feira, 1 de outubro de 2007

Poesia de Sebastião Borges de Barros e as Festas em Sua Homenagem

- Relação Summaria dos fúnebres Obséquios que se fizeram na Bahia, na
morte do Fidelíssimo Rei D. João V.

Soneto


“Quando ao Sceptro conspira a parca dura,
Também contra o Imperio se conspira;
Pois quando à Magestade a vida tira,
Ao orbe Lusitano a dor apura.

Contra o Monarca, e o Reyno se conjura,
Ao Reyno dando a pena, ao Rey a pira;
E tudo quanto a dor hoje respira,
São fieis exprestoens de magoa pura.

Nesta perda fatal do Soberano,
Todo o Imperio em fim sem refrigerio,
Sente a dor, sente a perda,e sente o damno:

Porém mais o Brasilico Emisferio
Por parte mais vital, se não me engano,
Ou por parte mayor do Luso Imperio.”

Este soneto foi escrito por Sebastião Borges de Barros e encontra-se editado no livro de seu irmão, João Borges de Barros. “Relação Panegyrica das Honras Fúnebres”.



FAUSTISSIMAS FESTAS



Conforme registro no catálogo de Barbosa Machado, as citações de Francisco Calmon, a respeito da Relação das Faustíssimas Festas que celebrou a Camera da Villa de Nossa Senhora da Purificação - Santo Amaro na Comarca da Bahia, esta festa foi motivada pelos Augustíssimos Desposórios da Serenissima Senhora D. Maria, Princesa do Brasil com o Serenissimo Senhor D. Pedro Infante de Portugal, seu tio, e dedicada ao Senhor Sebastião Borges de Barros, cavalleiro professo na Ordem de Christo, Capitão Mór das Ordenanças da mesma Villa, familiar do Santo Offício, deputado actual da meza de Inspecção, e Academico da Academia Brazilica dos renascidos, por Francisco Calmon, fidalgo da casa de sua Magestade, e Academico da mesma Academia, nascido na Bahia no dia 18 de Setembro de 1703.


Rubens Borba de Morais, informa que além da relação, havia três sonetos. Entretanto não constavam neste exemplar.


Ramiz Galvão comenta a obra como se segue:


" A raridade d'este opusculo e a circumstancia de se-acharem nelle descriptas festas celebradas em uma modesta villa do Brazil no anno de 1760 nos-impõem a obrigação de extractar d'elle o que mais curioso fôr. Eis em que consistiram essas demonstrações do publico regosijo":




  • dia 1º de Dezembro: pregão (1) publico das festas pelas ruas principaes da villa:


  • dias 2 a 7 do mesmo mez: seis dias successivos de luminarias:(2)


  • dia 8: festa annual da padroeira da villa:


  • dia 9: a primeira dança dos officiaes da cuttelaria e carpintaria asseadamente vestidos com farças mouriscas:


  • dia 10: tres contradanças dos alfaiates pelas ruas ao som de acordes instrumentos:


  • dia 11: as danças dos çapateiros e corrieiros:


  • dias 12 e 13: repetição dos mesmos folguedos:


  • dia 14: a dança dos congos, que apresentárão os Ourives em forma de embaixada:


  • dia 15: de manhan - o Te Deum laudamus na egreja da matriz de N. S. da Purificação, com missa cantada pelo coadjutor Manoel Dias Seabra, e oração gratulatoria pelo vigario Dr. francisco Xavier da Palma Mattos e Abreu; á tarde- procissão solemne acompanhada pelo Senado da Camara e pelo Regimento de ordenanças da villa commandado pelo capitão - mór Sebastião Borges de Barros; á noite -huma luzida encamizada de vinte parelhas, vestidos os Cavalleiros á Mourisca.


  • dia 16: á tarde saiu o Reinado dos Congos, que se compunha de mais de 80 mascaras, com farças ao seu modo de trajar, riquissimas pelo muito ouro, e diamantes, de que se ornavão e chegando aos Paços do Conselho, onde tomaram assento o rei e a rainha, lhes fizeram sala os Sôbas, e mais mascara da sua guarda, sahindo depois a dançar as Talheiras e Quicumbís ao som dos instrumentos proprios do seu uso, e rito, Seguiu-se a dança dos meninos Indios com arco, e frecha :


  • dia 17: Huma magnifica cavallaria de oito parelhas, Passadas as parelhas, tiraram lanças, jogaram as cannas, e fecharam o festejo d' esta tarde com uma bem ordenada, e vistosissima escaramuça:


  • dia 18 : - de manhan, sahio segunda vez o Reinado dos Congos com todo o seu estado; - á noite representou-se a comédia = Porfiar amando = sob a direcção de Gregorio de Souza e Gouvea, que foi tambem o auctor da = Loa = allusiva ao augusto matrimonio dos principes:


  • dia 19: á tarde - repetio-se a Cavallaria na forma praticada na do primeiro dia:


  • dia 20: á tarde - o mesmo folguedo da vespera, e mais o espectaculo dos carneiros, que os mesmos Cavalleiros déstramente cortárão, concluindo tudo com huma vistosa, e especial escaramuça:


  • dia 21 : sahio terceira vez a publico o Reinado dos Congos:


  • dia 22 : á noite - representou-se a opera da Fabula de Anfitrião ... executada ao vivo pelois mais déstros, e habeis estudantes da classe do Reverendo Padre Mestre João Pinheiro de Lemos. E assim terminaram os festejos tão curiosamente descriptos pelo Academico Francisco Calmon.

Matriz de Nossa Senhora da Purificação - Santo Amaro

Comparando-se estas citações com a descrição da Relação contida na Bibliografia Brasiliana, faltam aqui, duas fôlhas preliminares e duas fôlhas inumeradas, no final, onde estariam as licenças. (Nota do Autor do Catálogo).

Estas festas realizadas no período Colonial entre os séculos XVI e XVIII, foram muito bem explicadas por Mary Del Priore, no livro "Festas e utopias no Brasil colonial" a conceituada historiadora e escritora nos fornece explicações que achamos necessárias ao entendimento das Faustissimas Festas ocorrida em Santo Amaro, tão detalhadamente descritas por Francisco Calmon, destacamos alguns importantes textos:

" Havia Vários sentidos nas funções aparentemente irrelevantes da festa, dando persistência a certas maneira de pensar, de ver e de sentir. A mistura entre o sacro e o profano valia para diminuir e caricaturizar o pagão, o inculto, o diferente do europeu branco e civilizado. Os mitos pagãos eram assim esvaziados e recuperados para serem vivenciados exclusivamente como parte da festa. A América e a África, continentes recém explorados, eram retratados de acordo com os objetivos de colonização: escravos, pedras preciosas, aventura, fêmeas disponíveis - em tudo deviam parecer um espaço de concupiscência sonhada e de riquezas. O negro e o índio associavam-se ao perigo e ao mal e confundiam-se com os jacarés, cobras e dragões sobre os quais iam montados. Na sua estranheza aparecem também como o avesso da civilização ocidental cristã. Sua maneira de vestir-se apenas com penas e adereços justificava sua inferioridade técnica e, por conseguinte, a sua escravidão. Na 'festa dentro da festa' que é a procissão, percebe-se um canal eficiente de circulação de idéias entre colonizados, colonizadores, vencidos e vencedores, tristes e alegres" (Mary del Priore, 1994: 49/50).


"O Rei e a religião, numa aliança colonizadora, estendiam o seu manto protetor e repressor sobre as comunidades, manto este que apenas por ocasião de festividades coloria-se com exuberância". (Mary Del Priore, 1994: 15).


" Serão todos os irmãos desta irmandade obrigados a assistir a todas as festas do Senhor como fica dito, e muito principalmente a Semana santa em Quinta-Feira maior, pela manhã, para a solenidade daquele dia e semana, para a qual e para as mais da Quaresma" (Mary Del Priore, 1994-24).


"Homens bons, com ricas capas bordadas e cocares magníficos, montados em cavalos ricamente ajaezados, acompanhavam o procurador da câmara que lia o bando anunciando a festa. Para que nenhuma palavra se perdesse, um `porteiro' [cobrador de direitos reais] repetia suas palavras e ambos iam acompanhados do alcaide da vila" (Mary Del Priore, 1994:30)


" Em meio à pluralidade do evento que têm lugar regrado dentro da festa ( percebemos que há um rítmo entre o desfilar da procissão, a passagem dos carros alegóricos e os dançarinos, o momento da queima de fogos ou da cavalhada ), ocorrem fatos menores cuja função deve ser interpretada, quer salientando os momentos de integração entre diferentes segmentos sociais quer apontando suas maneiras específicas de usar a festa, como um espaço de diversão; tais partes do todo comemorativo são igualmente importantes para qualquer dos grupos sociais que dele participam" ( Mary Del Priore, 1994:63).

Poesias de João Borges de Barros

Abaixo, transcrevemos Sonetos do Dr. João Borges de Barros, Mestre Escola da Sé da Bahia, homenagem póstumas ao Rei D. João V - Relação Panegyricas das Honras Fúnebres.



1º. SONETO



“Do Luso Salamão, Monarca invicto ,
Todo o universo a perda infausta sente ;
Porque a quanto ilumîna o sol ardente ,
Chega do Império seu o amplo districto .

Da immensa dor o circular conflicto ,
Ao setimo trião, ao Austro ingente ,
Ao berço Eóo, à plaga do Occidente ,
Verte igualmente o pranto, forma o grito .

E inda a circulos novos se estendera
De Affetos immortaes fineza rara,
Em fé de quanto amára o que perdéra.

Não cabe enfim no mundo a dor amara:
Novos orbes suspira, nova Esféra ;
Pois se mais mundo houvera, lá chegàra .”


do Dr. João Borges de Barros
Mestre - Escola Sé da Bahia



2º SONETO


“Aquelle Augusto Rey, cuja grandeza
Nos ambitos do mundo não cabia ,
Quando a immortalidade merecia ,
Então paga o tributo a natureza .

Do orbe não bastava a redondeza
Para esféra da sua Monarchia ,
Porém hoje a hum sepulcro a Parca Impîa
Decahido o deixou de tanta Alteza :

Foy lastimosa accão, mas claro engano
Padece a Parca em mal tão fementido
Contra o nosso Monarca Lusitano :

Pois qual nos Astros sempre o Sol luzido ,
Se reproduz morrendo, o Soberano
Fica em suas acções reproduzido .”

Dr. João Borges de Barros
No Tumulo de Sua Magestade,

Os Tumulos

Daremos início ao mais importante dos poemas de Domingos Borges de Barros, feito quando da morte de seu filho, com apenas 10 anos de idade, vítima fatal de uma grave enfermidade. Este poema é a expressão de dor de um pai com a prematura morte do seu filho, é um poema romântico, bastante apreciado pelos seus contemporâneos.
Mereceu este poema a apreciação do Dr. A. J. de Mello Moraes que, o motivou a editar a poesia em sua 2a. edição na Bahia em 1850, através da tipografia Carlos Poggeti em um pequeno livro de 40 págs., merecendo também o prefácio, conforme abaixo :

"O poema que sob o título - Os Tumulos, publico eu hoje, é uma das mais belas producções literarias, que temos n’ este genero, do EXMO.SR. Domingos Borges de Barros, Visconde da Pedra Branca".
Estudava eu as humanidades, quando ás mãos me vierão os dous voluminhos das obras do ilustre poeta, e tanto gosto tomei, que me servirão de licção á muitos respeitos. Conhecia, que um vazio ficaria em nossa Literatura, se o nobre Visconde, deixasse incompleto o poema, que ora sahe á luz da publicidade. Correrão os tempos, e aprouve a Deos, que interesses communs ( As Irmãs de Caridade ) ligassem-me ao exímio poeta, e quando havia ganho o favor de sua amizade, pedi-lhe instantemente o resto do Poema, á completar o que se havia impresso. Minha exigência foi acolhida, e teve despacho o meu desejo, quando mal eu esperava.
Em dias de moléstia recebi tão grato presente, e na verdade nada veio tão oportuno á suavizar as dores, que a lição edificante e saudável, que me forneceu o poema Os Tumulos.
O ilustre Visconde, o amavel cantor das virtudes da mulher, queria que as dores de seu sensivel peito, não se avivassem mais ; queria que, de sua lira de oiro, os sons Divinos não lhe arrancassem do coração as justas saudades de seu perdido filho, do seu amor, ou mais ainda, do seu esperançoso futuro; porém que ! se de um lado isto queria o coração, a patria exigia o sacrificio da dôr _ dôr e sacrificios se experimenta e se fazem, pelo Amor e pela Patria.
Amor e Patria é o tudo de um homem.



Dr. Mello Moraes




Os Tumulos (1)
CANTO I


Longe risonhos engraçados sítios ,
Frescos ribeiros, auras perfumadas .
Esfriou nos meus labios o sorrizo ,
Nos meus olhos as lagrimas secárão .
Foi-se até de chorar triste consolo .
Gravosa ideá o espirito acobarda ,
Quebra-me as forças; já não vivo, existo ;
No futuro morri, morrendo o filho .(2)

É mansão minha o olvido, que vingado
Via em virtudes, que no filho abrião .
Meiga filinha, virtuosa esposa ,
Orfans comigo, iguaes na desventura
Vinde um adeus dizer ao irmão, ao filho.
Á noite cede o sol a etherea via ;
Longe de vãos prazeres, vamos juntos ,
Por entre sepulturas vagueando .
Amargoso consolo vem, saudade !

Palida fria luz derrama, ó Phefe !
Sentidas queixas, triste gorgeando ,
Desate suspirosa Philomena .
Mirtos, ornai amantes venturosos ,
Em torno de mim Cipreste mil negregem .

Um alheio e misero consola ,
Ninguem um ai me dá, ninguem me escuta!...
E compaixão procuro?... anhelo a morte :
A morte é o refrigerio dea desgraça ,(3)
É para o justo a noite d’um bom dia ,
A morte espanta só quando pensada ,
A morte é nada, a eternidade é tudo .

Cercado estou de túmulos ... abri- vos
Reino da morte, abrigo do infurtunio !
De chimeras caducas desengano .
Erguei- vos mestas, pavorosas loizas !
Ossos mirrados, lividos despegão ,
Fetidas carnes, podres ligamentos ,
Que impuros vermes em silencio pascem ;
Ascosos restos d formosas fórmas .(4)

Eis os profundos admirados sabios ,
Os Reis altivos, grandes, e temidos !
Nem teus visos Belezza aqui estremão .
Igual poeira dão, cajado e sceptro ,
Os farrapos do pobre, ea régia purp’ra ;
Na sepultura tudo se confunde ;
Tudo assim passa, a morte acaba tudo .(5)
Da humana vida a aurora, e o ocazo tocão .
É como a luz a vida, apaga-a um sopro .
Sabemos vida ter porque sentimos ,
Vem de fóra o sentir, a vida é nada .

Após honras serpeai resteiros entes ,
Esse raio apagai que vence a morte ,
A virtude ; e depois notai os tumulos !

De inconsolavel Mãe oiço os queixumes !...(6)
Sombra querida, do querido filho !
“Meu amor, meus desvelos, nada pôde !...
“Meu Deos, tanta oração, tão puros votos ,
“Tudo baldado foi !... Mas não augmenta
“Um esp’rito Celeste a gloria tua ,
“E perdi no meu filho a gloria minha .
“Se mais era que humana a prenda amada,
“Porque o fizeste assim, para roubar-m’o ?
“Para todos tão bom, és máo comigo ?
“Que mal te fiz, meu Deos?... Porém que vejo !
“Oh ! quanta luz diviso ! vejo as fontes
“Do eterno incompreensível !... éis meu filho!...
“Filho adorado, vem, corre a meus braços !
“Olha o seio infeliz de que naceste ,
“Olha estes peitos que te derão leite ,
“Conhece aquella voz que os sons primeiros ,
“A formar te ensinou, que te chamava
“Para teus jogos ; Tua Mãe conhece :
“Dos teus primeiros gostos companheira ,
“Companheira fiel nas tuas dores .
“Quem te beijava quando ao pobre davas ,
“Quem te beijava quando o amor da patria ,
“Vinha do coração no infantil fogo .
“Quem esquecendo o alimento, somno,
“Junto ao leito da dôr constante viste ,
“Quem pela vida tua, dera a vida .

“A cada passo um nobre monumento
“Do que serias, filho, vem matar- me ;
“Ó Brasil ! Ó Bahia ! ó patria nossa !
“Chorai meu filho, que um Heróe perdeste !
“Nem o materno amor me cega : digão
“Quantos o virão, qual a nossa perda .

“Dias de angustias assim porque fugistes?
“Vinda outra vez, trazei minha esperança ,
“Trabalhos mil com ella, emvora venhão .
“Deos, ou dai- me o meu filho, ou dai- me a morte”.

D’ um pai nenhum trabalho as forças quebra ,
Quando se vê na prole continuado .
A filha move sentimentos brandos ,
O filho eleva para a gloria o brio .
O filho é outro elle, além da tumba
Vê remoçarem as fadigas suas :
Do filho no esplendor, o porvir goza .
Lá vai seu nome de láurea ornado .
O movel principal de humanos feitos ,
O amor proprio, se dilata, e farta .

Ah ! como foges mentirosa esperança !
O doirado futuro como embaça
O halito da morte ! Vãos projectos !
Já de verdade o espelho formidavel ,
Mostra o que são da terra os bens caducos .
Que mais aspira o pai, que mais deseja ?
No futuro morreu, morrendo o filho ! ...
Hymeneo que de flores coroado
Sua dita fazia, e seu tormento :
A dôr lhe dobra da consorte as dores .
Fita a querida lamentosa esposa ,
Vê do filho as feições, não vê seu filho .

Alli brincava, aqui lia comigo ;
Este desenho é seu, eis sua letra !
Cobrem a meza insulsas iguarias .
Junto a mim se sentava ... Onde! Onde!
Ai ! como do consorcio o tecto amado ,
Cobrindo o casto amor, afflige agora !
Ai ! quanto fujo de mirar a esposa !
Leio em seus olhos o que n’alma sinto ,
E sei que os meus lhe estão dizendo o mesmo.

Nem eu nem ella pronunciar ousamos .
Partem do peito os ais, dos olhos pranto.
São ambos desditosos, mais se querem ,
E porque muito amão, temem-se ambos ;
A saudade os separa, amor os chama .

Tu meu tesouro, filha suspirada , (7)
Da vida alento, que tremendo adoro ;
Que trancendes no esp’rito tanto a idade ,
Qual teu irmão, precoce ! ... vai-te idéa ! ...
Como no frio, no forçado rizo
Com que para alegrar-me, o mal disfarças
Minha alma punges, com doçura amarga !
Constranjo o rosto á desmentir o peito .
Esse terno cuidado que desvia ,
De nossos olhos, do irmão perdido
Os moveis favoritos, os brinquedos ,
A custosa attenção com que o não chamas?
Teu doce agrado me envenena a vida .
Oh ! alma, de minha alma, ó minha filha ,
Vem a meus braços, vem, chora comigo ;
Não temas do irmão dizer o nome ;
Eia, de pranto nossa dôr fartemos .
Ainda a vida em flor, innocentinha ,
Ignoras o prazer, e a dôr conheces ?
Ahi a tens, guardai -a, ó Providencia !
Porque sem ella supportára a vida ?
A filha existe ... a vida te agradeço ;
Agradeço o seu mal, é bem da filha .(8)
Sacrificios humanos não te bastão ?
Sacrificio ahi tens com que não posso ,
Ahi tens meu filho morto : tenra planta
Longe do clima seu, medrar não pôde .
Patria, longe de ti, por ti soffria ,
Balança o amor da Patria, o amor paterno :
Que mais querem de mim ? mais sofrer posso !
Quebradas forças, animo abatido
Qual meu vigor te dei, dar-te-hei o resto :
Com que ufania te legava o filho !
Ó quanta n’ elle tu perdeste gloria ?
Ouve-lhe a voz extrema, a extremos votos ;
Elles quebrárão juntos do meu peito .
“Vinde a mim, caros paes, nada de pranto ,
“Pouco tenho de vida, ó paes ! beija-me ...

“Minha irmã onde esta ? quero abraça-la
“Pois que ao Brasil servir me não foi dado ,
“Ao menos saiba que por elle morro .
“O que o Brasil me deu, o Brasil tenha ;
“Não, não deixem meu corpo em terra estranha ,
“Entregue-me ao Brasil ... ultima graça ...
“Eu fui bom filho. Adeos !” e um ai ! meu filho !
Sombra adorada, assim o Heróe, o justo
No fim de longa vida o mundo admira .
Pia resignação, corage heroica ,
Serenidade sempre inabalavel
No soffrimento, e mesmo até desprezo .
Assim que de affeição via os indicios ,
Voava outrem não soffresse, impunha as dores ;
Com suas proprias mãos curava as chagas !
As bemfazejas mãos qu’inda estou vendo
Erguida para o céo, a Deos orando .
Inda me sôa n’alma a voz quebrada ,
“E baldado pedir, o céo me chama “.
Inda o que disse seu retrato vendo :
“Perdeis o original, guardais a copia”
Inda ... e é religião soffrer ? ... não posso .
Quanta vez os gemidos suffocando ,
Sobre o chagado corpo quantas vezes ,
O meu corpo estreitando, a mão convulsa
Desffalecida já, secou meu pranto ;
E com frio sorriso procurava
Um consolo me dar, forçando a angustia ?
Com a patria sonhava : e quando a febre
Abalava, pungia o assento d’alma ,
Era para exaltar o amor da patria ,
A saudade dos seus, o amor paterno .
Se ao Brasil não servio, morreu por elle .
Nem ao menos ó céo ! lhe deste o gosto ,
De ver, morrendo, a patria libertada !
Da Divindade arcano impenetravel ,
Inda na infancia, e já virtude tanta ! ...
Tinha dez annos ! ... Religião, conforto .

Sagrada habitação d’alma celeste
Lamentoso penhor, tristes reliquias !
Não, não sereis entregue á terra estranha.(9)
Vivo comnosco tu perigrinaste ,
Morto acompanharás nossos errores .

Ó tu que encerras, urna respeitosa ,
O puro coração do infante puro ,
Para tanta virtude estreito stadio :
Aquelle coração tão compassivo
Tão bom, tão Santo, além da idade sua ...
Urna que encerras da bondade o templo ,
Do desditoso pai te banhe o pranto .
Dá que te abrace em quanto aalma ao corpo .
“A seus pais, e ao Brasil” doce verdade ,
Que me lascera o peito ai ! ... já não sente ,
Immovel, frio ! ... nunca mais teu rizo ! ...
Tua voz nunca mais ? oh ! filho ! filho !
O halito de Deos, alma Divina ,
Á Deos voltou, no mundo não cabia .



Comentários de Mello Moraes a respeito da ( PARTE I ) do poema” Os Túmulos “.


( 1 ) - O que é um túmulo ? Sobre a terra não há cousa tão solemne ! , é uma expressão que não mente, que exprime em um só vocábulo, a creação e a eternidade ; o nascimento e a morte ; o princípio e o fim; as glórias transitórias e chiméricas do mundo, e o silencio sem fim ! um túmulo, é o desengano da vida, é a verdade eterna, que se levanta contra o orgulho do homem ; é a expressão sublime da grandeza do Eterno ! Oh ! como é solemne a vista de um túmulo! como a verdade alli se mostra, sem atavios nenhums ! E o que exprime mais descanço derradeiro da vida ? O nada do homem? ...
Homem o que és sobre a terra ? Que doteu orgulho, de tua vaidade ; onde estão tuas paixões, teu querer, tuas ações, o teu poder ? para que te serviu teu oiro ? Onde está tua espada, teu diadema, teu sceptro ? O que és sem religião .

A morte, é igual para todos ; quer seja Rei, quer plebeu ; quer rico, quer mendigo ; ella é a niveladora dos homens, é não tornar mais ! Expressão de desengano és tu o túmulo ! Sobre ti, só tem poder o Eterno; nada é capaz de dorar -te ? A somma de benefícios que se praticou, em summa, a caridade.

( 2 ) - Principia o poeta, este lindissimo e philosophico Poema, possuido dos mais tristes e lamentáveis sentimentos d’ alma, por ver que de encontro á lage do sepulchro, o seu amor, o seu mais risonho futuro, foi bater a eternidade .
Um filho, é o tudo de um pai extremoso, nelle encherga o seu porvir glorioso, e considera-se reproduzido á viver no futuro . Quando estas idéas alimentavão a existencia paterna, e cuidava o pai, seguro em seu futuro, a morte frusta-lhe a esperança e, sem mais conforto falla do intimo d’ alma .
Gravosa idéa o espirito acobarda, Quebra-me as forças ; já não vivo, existo ; no futuro morri, morrendo o filho .

( 3 ) - É no infortunio que bem se sabe apreciar o poder de Deos ; _ é alli que se conhece o nada das cousas deste mundo ; e que se conhece, que tudo creado por Deos tem um valor sem conta . A morte, que parece ser a ultima das graças que experimenta o homem, no infortunio ella é ás vezes o mais desejado bem : Tudo tem o seu dia de utilidade ! até a própria morte ! Egezias ( o philosopho ) entre as materias sobre que lecionava, era demonstrar á seus discipulos a vantagem da morte, e os males da vida, isto é, pregava ser mais feliz o homem que morria, que o que sobrevivia no infortunio _ Quereis exemplo vo -lo dá no infortunio um Napoleão em seu degredo, e outros, memorados pela historia .

(4-) - A philosophia, que em todo este poema aparece ligada com os mais tristes e melancolicos sentimentos d’ alma realça tanto e com tamanha expressão, que direito e sem preambulo se encaminha ao coração a abater-lhe o orgulho vaidoso . _ Como é, sublime e edificante a lição conciza d’ estes quatro versos ! Quantas verdades não incerrarão . Depois da morte nada é mais o homem, que podridão e misérias.

Ossos mirrados, lívidos despegão
Fétidas carnes, podres ligamentos ,
Que impuros vermes em silencio pascem ,
Ascosos restos de formosas fórmas . ­

( 5 ) - Estes versos podem ser uma imitação, ou versão livre e mui galante dos versos de Horácio:

( 6 ) - Não satisfeito de suas dores, o poeta no arfar dos sentimentos faz fallar o coração materno ( a Exma. Snra. Viscondessa da Pedra Branca D. Maria do Carmo Gouvêia Portugal ) na vehemencia da afflição e da dor, pedindo á Providencia a restituição de seu filho ! E tem razão : As vezes Deos attende as preces sinceras e ingenuas do coração materno .

( 7 ) - A Exma. Snra. Viscondessa de Barral .

( 8 ) - Apezar da dor profundissima e acerba do coração, vemo-lo aqui resignado e cheio de religião levantar os olhos humildes do pranto á Divina Providencia, possuído de gratidão a entregar -lhe a sua jóia mais querida . A poesia christã rica de sentimentos grandiosos e sublimes ao passo que deleita, conforta o espírito no infurtunio, e edifica-o na esperança de melhor vida .

( 9 ) - Domingos Borges de Barros filho, morreu em Paris, no dia 05 de Fevereiro de 1825 com 10 annos de idade ; alli foi embalsamado e transferido para a Villa de S. Francisco, e depois para a Capella do Engenho São Pedro, onde actualmente jaz .

*Autor das pesquisas:. Os restos mortais de Domingos Borges de Barros Filho, encontra-se atualmente no mausoléu dos "Borges de Barros" situado no Campo Santo em Salvador-Ba, junto aos restos mortais do seu pai Domingos Borges de Barros.

obs:. Procurei conservar integralmente a ortografia original de todas as obras transcritas nesse trabalho.

Nota: Falta o 2ª Canto do poema "Os Tumulos"

Diversas Poesias de Domingos Borges de Barros

Coletâneas de Diversos poemas de autoria do Visconde da Pedra Branca, Domingos Borges de Barros



A Noite
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Tu dos amantes silenciosa amiga ,
Que d’amor os misterios apadrinhas ,
Mais doces , quam dificeis .

Tu de quem o silencio favorece
Meditações profundas ; que do sábio
Hes o tempo querido .

Engrossa as trevas, enegrece as ondas ,
Noite, outr’ora de risos companheira ,
Sé hoje de suspiros .

Teu manto de brilhantes semeado ,
Que me aprazia contemplar outr’ora
Em pensativo arroubo ;

Do teu astro essa luz tão maviosa ,
Que aos meus os olhos do meu bem mostrava ,
Mais do que’la suaves .

Os fagueiros melindres, os carinhos ,
Mais brandos que de zefiro o bafejo
Que te adoça no estio .

Prazeres e tão vivos, e tão varios ,
Quaes em cores os circulos que cingem
De Cinthia a redondeza ;

Favores que avarento cala o peito ,
qual o silencio teu então calava ,
D’eles só testemunha ;

Ah ! não me lembres , não , mudem -se ó Noite ,
Doces momentos em tristonhas horas ,
Em lagrimas os risos .

Ó despotas d’amor divinos olhos ,
Lingua do coração, sim , eu te amo ,
Diceste antes que os labios .

Como d’amor pintaveis os enlevos ,
Extasis que sem vós dentro no peito
Abafados ficarão ?

Augmenta - se o prazer , prazeres dando ;
E vós da amada delatando os gozos
Juntaes ao nosso os d’ela .

Mais o pejo esconder procura os gostos ,
Mais indiscretos sois , doces traidores
D’amorosos segredos .

Em languidos requebros quando .... Oh ! longe ,
Longe moles lembranças , que enfraquecem
O peito nos perigos .

Ancioso pela Patria, a Patria busco :
Quaes d’ela são meu braço, e a vida, sejão
Meus pensamentos todos .

Ó noite, manda favoráveis auras
Que o espaço encurtem: Ah ! já são mui longos
Tão miseros errores .


Poema escrito no mar em 1810, indo de França para New - York .





A Meu Pai.



Ode




Improvisada ao fugir da França em 1810




Dos pulsos as cadeias de desatão!
Da tirania as velhas portas se abrem!
Quem he que pode tanto?


A patria, o pai, amigos, os parentes
Posso tornar a ver ? Deos piedoso,
Graças, Senhor, ah! graças!


Sim, n' essas roupas que dão mate á neve,
N' essa risonha face, reconheço
A meiga liberdade.


Não, não deliro, ó anjo bemfazejo!
Lé no meu coração, aceita as graças
Que devoto te envia.


Rasgado o negro véu com que o futuro
Os dias me enlutava : eis as cores
Do Iris bonançoso.


A mente livre já tem força nova,
De sobre o coração, cahe dos pezares
O enorme pesadelo.


Posso inda ser feliz! á patria posso
Dar os trabalhos meus, ao pai desvelos,
Amizade aos amigos!


Que! vou ver os lugares onde infante
Brincava, o teto patrio, os patrios ares,
As arvores, os campos ?...


Ó pai querido, posso da velhice,
De filho, e amigo dando-vos cuidados
Aligeirar estragos?


Do coração o jubilo transborda!
De gosto doces lagrimas afastão,
Dos olhos tristes lagrimas.


Sente-se, e não se dis o que ora sinto!
Lira, tu não tens sons com que descantes
D' alma enlevos tão belos.





A Saudade





Ode


Tu que n’auzencia privações disfarças ,
Na enganoza atração levando amente
Aos sítios da ventura ,

Que minoras o mal , nos ais que exhalas,
E sabes dár ás lagrimas que vertes
Agradação do gozo .

Vem querida Saudade , espelho fido ,
Em que amor ante os olhos da lembrança
O bem passado oferece .

O venturosa lua que os lugares
Vás de meus gostos ver, este suspiro
Toma , e n’eles derrama .

Dize - lhes onde estou ; que só me deixas
Por tristes companheiras, noite , vagas ,
E o desabrido noto .

Vai , dos formosos lumes de Marília ,
O sono pouco a pouco desprendendo ,
E languidos abrindo ,

Vai , e n’esse momento preguiçozo ,
Em que os requebros do celeste corpo
Vires, mal acordado ,

Dize - lhe docemente, porem n’esse
mudo falar que os labios não conhecem ,
Que os olhos só compreendem ,

Dize - lhe ! ... a tirania com que matas
He mui doce ó saudade ! basta, vai -te ,
Se me não deixas , morro .

Ó d’auzencia cruel querida amiga !
Tão vivas recordar gratas memorias
Bem he, peior que o mal .

He dar amargo fel em taça de oiro ;
Dobra o mal do infeliz do bem o aspecto ,
Basta , não mais saudade .


Indo de França para os Estados - Unidos d’America em 1810.






Ao Chegar à Bahia





1811


Salve ó berço onde vi a luz primeira !
Rizonhos montes, deleitosos ares !
Eu te saúdo ó Pátria !

Como no peito o coração festeja !
Todo me sinto outro: são delícias
Quando em torno a mim vejo

Tem outro ar o céu, outro estas árvores !
Por onde adeja zéfiro embalsama ! ...
Dá te beije ó terra !

Deste que só tu dás prazer, teres lustro,
Privado qual proscrito arrasto a vida
Em forçado errores .

Oh ! quanto da ventura o ledo aspecto
Das passadas desgraças a lembrança
Nos apresenta viva !

Não houvera prazer se a dor não fora ;
Perene fácil gozo, toma aa essência
Da fria indiferença .

Aqui foi que eu nasci, devo a existência ,
Devo tudo o que sou a ti ó Pátria !
Eis - me: é teu quanto valho .

É nos trabalhos que no peito ferve
O nobre patriotismo, o braço, o sangue .
Aqui te entrego , ó Pátria !


( Florilégio da poesia brasileira ) Tomo III - Madri 1853 pag. 181 .
Gabinete Português de Leitura.



A Melancolia .





Ode


Chame embora prazer a mente stulta
O enfadonho motin das sociedades ,
Imagine gozar quando se aturde
Na importuna alegria .

O perfeito prazer mais que do gozo
Deixa á pós si delicia duradoira ,
Que longo tempo a mente saboréa :
No gozo a d’ele expira .

Em quanto da ilusão se nutre o vulgo
Oh ! como he doce junto á clara fonte ,
No verde manto do Salgueiro envolto ,
E Marilia na idea ,

Ver a macia luz que Cinthia espalha ,
O bafejo sentir com que Favonio ,
Do bosque silencioso agita as folhas ,
Convidando os suspiros !

Se um barco alveja então sulcando as aguas ,
E se vai pouco a pouco separando ,
Do apartamento imagens que desperta ,
Poem no quadro a Saudade .

Mimosa companheira da ternura ,
Do mal ao bem passagem feiticira ,
Suave agitação , em qu’alma goza
Sem esse afan do jubilo .

Prazer que tens de dór feições mui fracas ,
A tristeza te apraz , os ais te agradão ,
São gostozas as lagrimas com tigo ,
Doce Melancolia .

Só delicado espirito aprecia
A delicia que dás , tu não te mostras
A escura multidão de humanos rudes ,
E vulgares amantes .

Mais queres do que amigo, terna amiga ,
No coração de quem meiga te entornes,
Mais delicada , melhor sabe a lingoa
Que dilata as delicias .

As tuas misturar sabe uma lagrima ,
Que filtra ao coração : da frauta sente
Os maviosos sons , que suspiravão
Metastassio , e Tibulo .

Suave Lilia assim passei com tigo ,
Quando depositava no teu peito
Uma vez os desdens , outra as meiguices
Que Marilia me dava .

Sempre que te busquei , consolo tive ,
Contando - te meus gostos duplicavão,
Eas mogoas repartindo , nos carinhos
Minoradas sentia .

Em pranto beijo os maviosos versos ,
Que fino tacto , e as graças te dictarão ;
Do espirito a polidez , d’alma a candura
N’eles saudoso admiro .

Porque fora dos máos , os bons unidos
Qual nos Elisios , cá , viver não podem ?
Porque he forçozo , ó Lilia , que dos mares
O espasso nos separe ?

Arte divina que a distancia ilude ,
A escrita , ó Lilia, supra - nos as vozes ,
Sempre , sempre de ti , dos teus me fala ,
E as vezes de Marilia .


No mar indo do Rio de Janeiro para a Bahia 1813 .



A Gratidão




Ode

Para fazer o bem ternura basta ,
O dó despertão do infortunio as queixas ,
Ao bem fazer nos leva oculta força ,
Que a disgraça acompanha .

Tal prazer se experimenta o bem fazendo ,
Que he fazer o mal a si privar - se d’ele ;
Longe dos homens coração de ferro ,
Se o que digo não sentes !

E nem da ingratidão, para disfarce
Do gelado egoismo , armar-te busques ;
Não fora tão gostosa a humanidade ,
Se os ingratos não fossem .

Melhor que o bem fazer so tu conheço
Ó nobre Gratidão ! Se hes menos doce ,
Do beimfeitor o aspecto olhar sem pejo ,
Tem do sublime assomos .

Fas superior a outro o beneficio ,
A idéa de inferior fere a philaucia ,
Exaspera o equilibrio mal guardado ,
Da balança da sorte .

Ensovalha o favor se vem do orgulho ,
Abafa a gratidão ; se vem do honesto
Delicadeza o enfeita , alegra , e perde
Do favor o ressabio .

O pobre não coteja os seus farrapos
Có brocado do rico se o merece ,
Da bem fazeja mão a esmola aceita ,
Qual dom da divindade .

He tão belo em segredo ornar de pranto
O beneficio , quanto ao que o recebe
Co a voz da gratidão alto dize - lo ,
Assim ambos se honrão .

No mar em 1813 .







A Virtude





Ode

O homem co’a invensão supera o bruto ,
O impulso das paixões co a razão doma ,
Amor o faz humano, a honra probo ,
Ornalhe a mente o estudo .

Mas no olvido dos seculos a morte
Tudo some , se vós porção do Eterno ,
Vós qu’ao Eterno semelhaes o homem ,
Não lhe endeuzaes o espirito .

Da omnipotencia a Mão sinto elevar -me ,
Fora me julgo da fraqueza humana ,
Quando falas virtude ; e ao mesmo Eterno
Cuido tocar de perto .

Se a força ao cadafalso o justo arrastra ,
Cahe das mãos do juiz das leis a espada ,
Córa a injustiça , treme a tirania ,
E ant’ele réos parecem .

O perigo, a mizeria ant’ele embora
A enorme catadura açanhe , afeie ,
Baqueie o mundo embora, entre as ruinas
Sereno altea a frente .

A seu mal impassivel, terno ao d’outrem
Não goza se outro sofre, a dór espreita
E os bens que fás com lagrimas ornando ,
Nunca insulta o infortunio .

De - rojo, quando vil serpeja o crime ,
Brilha, qual resplendor de luz celeste ,
Na eterea região o espr’ito a deja
A tudo sóbranceiro .

O que ao vulgo deslumbra desdenhando ,
Da Fortuna ouro - pel, n’adversidade
De fingidos amigos não espanta
O refalsado rosto .

Sem ti nobres paixões se tornão vicios ,
He concluio a amizade, amor licencia :
Grasna o remorso se emudece o crime
No peito do perverso .

Na vida o máo do bem goza arremedos ,
Na morte os crimes em tropel o esmagão ;
Todo he remorso então : có a morte o justo
Melhor vida recebe .

He da vida no termo, he na disgraça
Que desfeitos do enganos os vãos fantasmas ,
Chorando os devaneios, porem tarde ,
Pela virtude exclama .


Indo do Rio de Janeiro para a Bahia em 1813 .


A Amizade








Ode


Suave inclinação d’alma sensivel
Do sabio apreciada , e mais querida
Do homem virtuoso .

Tu que do amigo ao lado o gosto augmentas
E a poucas o pezar : mimo do Olimpo
Carinhosa Amizade ,

Do puro coração deleite, e vida ,
Irman d’Amor; sem venda, sem archote
Sem agro de ciume .

Mais do que amigo, só conheço amiga :
De seu sexo meiguices privativas
A Amizade requintão .

O amigo he outro eu, no amigo existo
E olaço encantador que as almas prende ,
Es tu nobre Amizade .

Na Amizade o favor desaparece
São gostozo dever os sacrificios
Tudo merece o amigo .

Para salvar o amigo o pr’igo esquece ,
A sanha da disgraça afronta, e a morte
O animo sublime .


Indo do Rio de Janeiro para a Bahia, no mar 1813 .





ODE









Recitada a 12 de outubro de 1823 .

No incauto povo os crimes embebia
Por labios embusteiros enfeitados ,
Maculando a fagueira Liberdade
Demagogia astuta .

As mimosas feições , as lindas formas ,
Do viçozo Brasil, já se afeavão ,
Sob as sanguentas garras com que ancioza
A Anarchia o empolgava .

As Maens choravão já , tremia o espozo ,
Os degraos do patibulo a Virtude
Contava já, e aos urros da revolta
Jubilava o perverso .

Lá cahe o Imperio de aluîdas bases! ...
No ameno Vale, na floresta virgem ,
Lá se estende o ribombo surdo, e rouco
Do mugido do crime .

Rasgado o coração ! ... ai ! Pedro ! Pedro !
Morre , se tardas, o Brazil, acude !
Defende - lo juraste, o voto cumpre ,
Se não, aos ceos insultas .

Onde os punhaes ? e o halito empestado ,
Que em negra nuvem sobre nós pezava ?
Eis o céo azulado, o ár suave
Que dá vida ás delicias .

Salve ! querido Brazileiro dia ? ...
Tu, que em dote ao Brazil seu Pedro deste ,
No circulo dos Evos perguiçozo
Volve, puro, e risonho .

( Este poema está no II tomo das “ Poesias “ ) .






Prosa Póstuma


"Trovas do outro Mundo" Obra psicografada pelo médium Francisco Cândido Xavier no ano de 1968, participação de Diversos Espíritos.



Trovas
Domingos Borges de Barros


A vida na Terra é um drama,
Cujo entrecho não deslindo:
Os que nascem vão entrando,
Os que morrem vão saindo.

Além da velha morada
De pedra, cinza e cipreste,
A morte diz o que foste,
Diz a vida o que fizeste.

Neste mundo, muita gente,
Buscando o que julga seu,
Faz-se o túmulo vivente
Dos sonhos de quem morreu.

Meu corpo – antiga tapera –
O tempo levou ao fim,
Mas meu sonho – a primavera –
Prossegue dentro de mim.

No Além a saudade mora,
Mas a que atinge os extremos
É a saudade dolorosa
Das saudades que tivemos

Cartas do Imperador para a Condessa de Barral

“ Os anos passam , a política muda, as dores arrefecem, mas depois de tanto tempo é inalterável a amizade dos Imperadores com a Condessa de Barral. Eis uma carta do Imperador naquela sorte de amizade- amorosa, que deu o nosso ilustre amigo Raimundo Magalhães Júnior a convicção de um amor real e de uma união em longo período de adultério; assim escreve num dia de março de 1884, D. Pedro II à amiga. ”


“Condessa que boa carta é a sua de 24 do passado ! Você ainda não imagina quanto me aflige não demonstrar-lhe ainda mais quanto lhe quero e por isso agradece-me o telegrama pelo dia 17. Querer como lhe quero é muito bom; porém sofre-se muito na ausência sobretudo na minha posição. Você sabe que não sou inclinado a contar destas histórias que muitas vezes nem mesmo sei pois não procuro que m’as refiram.

“Na nossa idade creio que não devemos senão saborear a amizade de mais de 30 anos”

- Comentário e Carta pesquisada no livro ( Cartas a suas majestades ).



Rio 24 de dezembro de 1884


Condessa


Respondo a sua carta de 19 do passado. Que boa é ela ! As saudades aumentaram. Não imagina a falta que você me faz.
Nada de maior. As eleições têm me entristecido. Veremos a Câmara que vem. Há de dar que fazer. Não desanimo, e felizmente ainda posso trabalhar bem. Os incômodos quase que desapareceram.
Os viajantes têm ido muito bem.
Amanhã já durmo em Petrópolis. Que calor aqui e que roda-viva !
A Argemirinha e o marido lá vão a 25 - Amanhã - para Sta. Catarina.
Muito me afligiu a morte de D. Rosa. Ainda me lembro dela.
Peço-lhe que dê pêsames em meu nome a Mme. de Villers.
Tenho ainda muito que fazer. Adeus ! Brevemente escreverei como desejo. Meu abraço a nosso caro rapaz. Muitas lembranças à Mãezinha; beijinhos ao Joquinha e para você tudo de


Seu de sempre

P
Petrópolis - que saudades! - 30 de Dezembro de 1884


Condessa


Recebi ontem seus escritos sem data. [parece com nossa amizade] Apesar de você supor que eu estava de humor bem sabe que com você jamais [nem tanto] brigo deveras. Digo-lhe somente tudo o que penso.[até um certo ponto. Há 2 modos de pensar en dehors et en dedans-]
Estes dias daqui já me tem feito muito bem ao físico. Tem chovido quase sempre de tarde; mas ainda não deixei de sair segundo o custume.
Os Amelots estiveram hoje cá.[como vai Rosalie da pele?] Tereza Drummond ainda não veio visitar-se aqui.[V. M. ainda não me falou nela]
A pobre Mme. Sandford parte a 9 para a Inglaterra.Parece que ficou mal de furtuna.[Coitada]
As notícias de meus filhos e netinhos são excelentes. Faze-me ......
muita falta.[-Naturalmente ......]
Quantas vezes tenho ...... Hotel Orleáns, e o ...... varanda, não falando da casa perto do portão - lembra-se ainda do nome do porteiro, e ouve o toque do sino? [ora se me lembro do Sr. Rosário! estou ouvindo o Sino! ... Le Cantique des Cantiques!! -]
Comecei minhas leituras prediletas, mas por doença do Henning a quem dão agora erisipelas nos pés não continuo os meus estudos com eles.[o Bispo de Orléans dizia j’ai eu 7 Secrétaires tués sous moi, V.M. vai matando muitos mestres] Não há mais Schreiner [ E esse o que é feito dele?] para o Árabe. Enfim que diferença de Petrópolis dos bons tempos!
Depois de amanhã por ser dia santo não há trem pela manhã para a cidade e por isso dou-lhe desde já bons anos como lh’os pode desejar quem tanto e tanto lhe quer. Transmita-os também com meu abraço a nosso caro rapaz e receba-os também a mãezinha, e ....... muitas festinhas o Jojoca [todos lhe beijam a mão.] ...... a parte ...... de estar lá pelo pensamento.Tome o abraço de sempre do


Seu

P


Petrópolis 14 de janeiro de 1885

Condessa

Respondo a sua carta de 18 do passado.
Sabe como as recebo sempre.
Se não lhe escrevo por todos os vapores, é porque às vezes com o que tenho que fazer não sei da partida do vapor.
Logo que Itajubá telegrafou a notícia de cólera como epidemia, e não esporádico ou cólera - nostro que se tomaram as medidas aconselhadas pelo inspetor da saúde do porto; professor da Escola de Medicina muito inteligente. Já expliquei o motivo do fechamento dos portos. Há muito que eu mesmo falei na necessidade de lazareto, para qualquer caso futuro; mas seria quase impossível obter das Câmaras o dinheiro precioso; pois que epidemia vinda do além do oceano so a tivemos a mais de 20 anos.
Mais do que em lazaretos creio na boa higiene das povoações.
Minha perna esta quase pronta e poupo-a o que é preciso. A estada aqui tem me feito muito bem à saúde em geral.
Minha vida é o que sabe e que saudades de lá colho eu em tantas partes !
Quem me dera estar também na Grande Garenne; mas você sabe bem porque. Cada vez lembro mais de nossos bons tempos.
Nada nenhuma novidade de aqui. Parece-me estar tudo calmo em relação ao ano passado. Já lhe disse que estava aqui a Ministra da Rússia Montenegrina - não da Herzegovina. Tem ar modesto e creio ser muito boa senhora.
O Ledchine retira-se amanhã para a Europa. Parece-me levar saudades daqui.
A Tereza Drumond passou num bonito carrinho, e encontrei-a esta manhã com Mme. Amelot.
Ontem choveu a valer quase todo o dia, e estouraram, sofríveis trovões. Quando cai aqui às gamelas parece-me que se abre a porta de vidraça do saguão, a você me aparece com seu ruge-ruge antes de vê-la.
Tenho lido e estudado bastante, e sem cansar-me. Carecia desta vida tranqüila.
Adeus ! Meu abraço a nosso caro rapaz. Muitas lembranças à Mãezinha, beijoca ao jojoca e para você tudo o que lhe dá nossa amizade.
Você pensará em mim como eu em você. Adeus !
Seu de sempre

P


Petrópolis 7 de Janeiro de 1886 [1887]


Condessa

Recebi hoje sua carta de 14 de Dezembro. A partida de meus filhos e netinhos foi-me muito dolorosa.
As saúdes são boas.
Meto a mão na consciência e assevero-lhe que é calúnia o que disseram de cartas suas mostradas e do mais [ pois disseram e muito mais.]
Você sabe como penso a respeito da educação dos Jesuítas [ eu a acho excelente ]
Reprovei que as prisões publicas servissem para guardar escravos e disse que competia aos senhores providenciar para que eles não fugissem e aplicar-lhe os castigos que as leis permitem.
Agora já foi abolida a pena de açoites. [ Mas cada proprietário castiga at home ]
Nada perguntei sobre o mistério da encarnação. Apenas notei o erro ou falta de clareza do livro de doutrina adotado que dizia que Jesus Cristo fora concebido do espírito Santo quando tinha sido a Virgem Maria por obra e graça do Espírito Santo. Sempre sustentei a necessidade nas escolas do Brasil do ensino religioso. Agradeço-lhe perguntar-me tudo isto, embora você decerto não acredita em tudo [ Não em tudo mas em muitas coisas sim ] o que lá lhe chega ou se inventa a meu respeito. [ Não há fumaça sem fogo ]
A Amelot ia morrendo de uma queda de cavalo. [ Estou sentidíssima ] . Ia só . [ que imprudência ! ] O cavalo empinando-se e recuando caiu num buraco em cujo fundo ficou ela felizmente, não sofrendo assim todo o peso do cavalo que só levantaram de sobre passados alguns minutos. [ Que horror ! ] Quebrou o colo do fêmur; [ pobrezinha ] mas fora da cápsula. [ Não sei onde é essa cápsula ] - Não tem tido febre e o estado geral é bom [ Deus seja louvado ] já se lhe aplicou um aparelho provisório. Sucedeu isto na manhã de 4 .
Brevemente lhe escreverei de novo.
Adeus ! Meu abraço a nosso caro rapaz. Muitas lembranças a Mãezinha, festinhas ao Jojoca. Queria falar-lhe só no fim da leitura da biografia de seu Pai pelo Dórea; mas você poderia tomar meu silencio por esquecimento. Muito me agradaram as duas leituras já feitas. Soube muita coisa interessante que eu ignorava da vida de seu Pai.
Adeus ainda !